Pesquisar este blog

sexta-feira, 9 de abril de 2010

PRONUNCIAMENTO DE DEPUTADA EM 1995 SOBRE A CORSAN


 ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO

DO RIO GRANDE DO SUL

109ª Sessão Ordinária

Realizada em 05 de dezembro de 1995.





A SRA. LUCIANA GENRO (PT) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados:
Saudamos os colegas estudantes, moradores das casas de estudantes autônomas de Porto Alegre e da Grande Porto Alegre, que estão presentes para acompanhar a votação do nosso projeto que destina verbas a essas casas, seguindo o que determina a nossa Constituição estadual.
O que nos traz a esta tribuna, no período de Apresentação e Discussão de Proposições, e uma denúncia bastante séria que chegou ao nosso gabinete, assim como ao gabinete de outros deputados. Essa denúncia é baseada em anúncios publicados no setor de classificados no jornal "Estado de São Paulo", nos dias 21 de agosto e 18 de setembro. Esses anúncios parecem demonstrar concorrências fraudulentas em contratos realizados pela Companhia Riograndense de Saneamento Básico, a Corsan.
A documentação que me foi enviada inclui avisos de julgamento e súmulas de contratos coincidentes com os nomes das empresas que foram apontadas nesses anúncios de classificados, publicados antes da abertura dos envelopes dessa licitação. Essa concorrência fraudulenta teria se dado em quatro editais para compra de canos para a praia de Arroio de Sal, tubos de ferro para o sistema de esgotos de Passo Fundo, construção de reservatório e estação de tratamento na praia de Curumim. Essa última, por exemplo, tem um orçamento de obra avaliado em mais de 2 milhões de reais.
A denúncia dá conta também de superfaturamento na compra de canos a serem utilizados nas obras de parceria da Corsan.
Esses canos, comprados na distribuidora a 1 real e 50 centavos, estariam orçados nesses contratos em cerca de 3 reais. Tudo isso seria feito a partir de um acordo com a Associação Gaúcha de Empresas de Saneamento no sentido de que o critério preço, utilizado pela Corsan para determinar as licitações, fosse antecipadamente acertado, para que se fizesse uma distribuição eqüitativa entre as empresas concorrentes, cada uma levando sua parte - obviamente, mais pessoas também obtiveram vantagens.
Estamos apresentando um requerimento à Comissão de Serviços Públicos de convocação urgente do ex-presidente da Corsan, Sr. Berfran Rosado, e do seu diretor, Paulo Medeiros, apontados como responsáveis pelas fraudes ocorridas por ocasião da licitação.

SESSÃO PLENÁRIA 07 DEZEMBRO DE 1995
A SRA. LUCIANA GENRO (PT) - Sr. Presidente e Srs. Deputados:
Retornamos neste momento ao assunto referente à Corsan. Temos acompanhado as declarações do líder do governo nesta Casa, bem como as prestadas pelo governo à imprensa, no sentido de que as denúncias por nós apresentadas, chegadas as nossas mãos anonimamente e por nós levadas a público, não têm fundamentos. Estamos ainda aguardando os documentos que comprovam não ter havido uma prévia combinação nas licitações apontadas.
Na nossa opinião, existem ainda muitas perguntas sem resposta neste caso. Algumas dessas perguntas já foram por nós formuladas desta tribuna e outras o serão neste momento. A primeira delas diz respeito às denúncias de superfaturamento na Corsan. É verdade ou não que a Corsan fez contratos com empreiteiras, estabelecendo como preço do metro de canos 3 reais e 40 centavos, quando esse produto pode ser adquirido na fábrica por 1 real e 50 centavos? Não temos ainda essa resposta. Por que este governo inclui nos contratos que faz com as empreiteiras também a compra do material, se, até pouco tempo atrás, o material era adquirido pela própria Corsan? Isso facilita o superfaturamento e encarece o valor do contrato com as empreiteiras. O empréstimo anunciado pela Caixa Econômica Federal, para a realização das obras suspensas pelo governador, foi ou não concedido? Foi suspenso porque a própria Caixa Econômica Federal constatou o superfaturamento ou não? Estamos aguardando as respostas a essa questões. Foi feito ou não um contrato de nº 311 com a empresa Ecoplan, no valor de quase l milhão e 300 mil reais, sem licitação, alegando-se alta especialização, quando há várias empresas semelhantes à Ecoplan, que prestam consultoria? E foi esse contrato ainda ampliado para a área de informatização, quando essa empresa nada tem a ver com informatização? É ou não é verdade?
É ou não é verdadeira a informação que recebemos de que o atual diretor de extensão da Corsan era, até antes de assumir seu cargo, funcionário de uma empreiteira?
É ou não é verdade que um empreiteiro, desclassificado em uma das concorrências do governo passado por ter fraudado documentos do DMAE de Porto Alegre, hoje é chefe da residência da Secretaria de Obras de Bagé? Recebemos essa informação e gostaríamos que o governo a confirmasse ou a desmentisse.
Que resultados, que apurações e que atitudes práticas foram tomadas em relação a 313 irregularidades que a CAGE apontou no Governo Simon/Guazzeli e nas 209 do Governo Collares?
É ou não é verdade que as licitações, segundo informação do próprio Sindiágua, são abertas e, ao invés de pedirem mão-de-obra, que é do que realmente elas necessitam, solicitam prestação de serviços? Com isso, apenas três ou quatro empresas podem participar e acertarem-se previamente.
O supercontrato, denunciado em 1993 pelo sindicato, realizado por ninguém menos do que o atual diretor de extensão da Corsan, Paulo Medeiros, que presenteou com aparelhos caríssimos a empreiteira STE, existiu ou não? Ele foi ou não apontado como irregularidade?
Os vários casos em que apenas uma empresa concorre nas licitações comprovam ou não a tese denunciada, pelo sindicato e por essa denúncia anônima, de que há uma cartelização das empresas, que se arranjam entre si para determinar quem fica com qual obra?
Gostaríamos muito de receber respostas para essas perguntas. Levamos a público denúncias que vão no mesmo sentido das que, historicamente, foram levadas a público pelo sindicato.
O governo, em vez de abrir uma ampla apuração de tudo o que há sobre a Corsan, quer abafar o caso. Nós, neste momento, queremos apenas ouvir os Srs. Berfran Rosado e Paulo Medeiros, bem como o sindicato, na Comissão de Serviços Públicos desta Casa, objetivando esclarecer todas essas questões. Muito obrigada. (Não revisado pela oradora).




ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO

DO RIO GRANDE DO SUL Comissão de Serviços Públicos

Reunião Realizada em 30 de maio de 1996

A SRA. LUCIANA GENRO (PT) - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar, gostaria de esclarecer que a denúncia original por mim levada a público não tratava apenas de resultados antecipados de licitação. Essa denúncia está na CAGE, assim como no Ministério Público, e ela dava conta, além dos resultados antecipados de licitação, de superfaturamento, de cartelização entre as empreiteiras, de contratos feitos sem licitação, de contratação irregular de mão-de-obra terceirizada, etc.
Em segundo lugar, o Senhor disse que o enfoque apresentado pelo relatório da CAGE poderia causar danos insuportáveis ao processo democrático de discussão. Essas foram suas palavras. No entanto, o governo do Estado não teve nenhuma preocupação ao utilizar o relatório inicial e parcial preliminar - como o Senhor disse - a respeito dos resultados antecipados de licitação para acusar esta Deputada de estar fazendo "molecagem" e "armação política". Não houve a preocupação, por parte do governo, em evitar danos insuportáveis ao processo democrático naquele momento. Ao contrário, o governo promoveu uma grande festa na imprensa, utilizando-se daquele relatório parcial que falava apenas de um aspecto da denúncia que eu havia apresentado para tentar encobrir ou desmoralizar o conjunto das denúncias. Esse é, para mim, um comentário bastante importante.
A nota oficial que o governo do Estado emitiu a respeito do relatório da CAGE diz que ele não comprovou irregularidades, apenas "equívocos administrativos nos procedimentos formais". Gostaria de mencionar alguns aspectos do relatório para que possamos analisá-los conjuntamente. Se o Senhor vem aqui dizer que o relatório da CAGE está equivocado - e essa outra discussão - gostaria que fosse admitido que o relatório da CAGE aponta, sim, irregularidades e não apenas equívocos administrativos.
Na página 21, o relatório esclarece o seguinte: "A atual Diretoria de Expansão da Corsan admitiu ter sido irregular a aplicação de percentual de BDI". Para quem não tem conhecimento do assunto, falamos do percentual de Benefícios e Despesas Indiretas. Benefício é o lucro da empreiteira; despesas indiretas são os impostos e outras despesas eventuais. Continuando: "Percentual de BDI de 45,6% foi aplicado irregularmente, quando o correto seria de 30,8%". No mesmo relatório, a CAGE demonstra os equívocos, ou as irregularidades, que estão sendo cometidas na composição desse BDI, como o Senhor mesmo mencionou, a inclusão do adicional estadual de Imposto de Renda, que é considerado inconstitucional pelo Supremo, desde 1993.
A Corsan não tem conhecimento das resoluções do Supremo Tribunal Federal. O relatório também menciona, a respeito da formação do percentual do BDI, que a Corsan computa impostos duplamente em dois itens diferentes. Também menciona que o percentual, a título de "despesas eventuais", que deve constar no BDI, desde 27 de janeiro de 1994, era de 5% e que agora passou para 10%. Revela ainda que esses mesmos 10%, que devem cobrir despesas, tais como o pagamento de mão-de-obra, que deve ser paga mesmo que chova a semana inteira, é aplicado sobre o custo do material. Que tipo de despesa eventual pode ter a empreiteira em ir à loja e comprar o material? Isso é totalmente irregular, de acordo com o relatório da CAGE.
Revela o relatório, na página 27: "A Companhia ainda superestimou o preço das conexões em PVC quando não lhes concedeu o desconto de tabela devido de 33,33%. O percentual que deveria ser agregado ao preço dos tubos de PVC, PVA a esse título "conexões", deveria ser de 17,1% e não de 23,35%, como foi de fato praticado, já por si só representando uma distorção inexplicável de 6,24%". Essas são palavras da CAGE e não minhas.
O relatório revela, em sua página 28: "Consideramos a explicação da empresa totalmente inconsistente e resolvemos comparar os orçamentos de preços das conexões, segundo a equipe da Corsan, com os preços coletados pela CAGE no mercado internacional". Vamos ver o resultado dessas comparações: "Foi apurado o valor de 15.169 e não 34.800, como foi o valor estipulado pela Corsan, no mês de abril de 1995. Em algumas conexões em ferro fundido, os preços de janeiro de 1966, da tabela do fornecedor da Corsan, que se chama Conexo S.A, chegaram a ser 270% inferiores aos orçados nove meses antes".
Na página 30 do relatório, lemos: "Neste caso, encontramos produtos cujos preços subiram até 2.550% nos orçamentos oficiais da Corsan, orçamentos que serviram de base às propostas das empreiteiras".
Na página 31, o relatório afirma que a Corsan tentou "camuflar esta operação, totalmente inaceitável, quando se refere ao percentual de BDI de 45,6%". A CAGE está dizendo que a Corsan tentou camuflar esta operação, não são minhas essas palavras.
Se não há irregularidade, gostaria que o Senhor se manifestasse quanto ao fato apontado pela CAGE, na página 69: "O administrador público formalmente observa o estatuto das licitações. No entanto, em conseqüência do que foi abordado, verifica-se que os princípios básicos constitucionais de eficiência, eficácia e economicidade, na prática, não vêm sendo perseguidos pela Corsan". Não cumprir um princípio básico da Constituição não é uma irregularidade? Acho que é.
Se o relatório da CAGE não aponta irregularidades, por que ele recomenda, na página 73, que se verifique de quem é a autoria e a co-responsabilidade na Diretoria de Expansão? A CAGE inclusive especifica qual é a diretoria que deve ser responsável por esses problemas - pela execução dos orçamentos mencionados para fins de responsabilização. Por que alguém deveria ser responsabilizado, se não houvesse irregularidade? Responsabilizado pelo quê? É óbvio que por irregularidades. Ou o governo deve dizer que há um complô da CAGE contra ele, porque ela inventa irregularidades que não existem?
Denúncias de superfaturamento na Corsan não são uma novidade, e não fui pioneira em apresentá-las. Realmente, esse não é um privilégio desta diretoria. Há hoje na Justiça uma ação movida pelo Ministério Público - não pelo sindicato, ou por algum deputado de oposição - por superfaturamento contra o presidente da Corsan na época do Governo Guazzelli, coincidentemente do PMDB também, o Sr. Tadeu Viapiana, que, por sinal, é dono da agência de publicidade que detém a maioria das contas do governo do Estado atualmente - mas, isso é apenas um detalhe.
Essa mesma ação por superfaturamento é contra a Sra. Ellen Gotens, hoje diretora do CIEL, cargo de confiança indicado pela presidência da Corsan. A mesma Senhora que está sendo acionada por superfaturamento numa ação do Ministério Público é diretora de uma empresa coligada da Corsan. O Senhor não acha que é, no mínimo, um pouco arriscado confiar numa pessoa que está sendo acionada por superfaturamento?
Não é muita coincidência que o Sr. Paulo Medeiros, que foi diretor de Operações da Corsan na administração que está sendo acionada pelo Ministério Público por superfaturamento, seja, hoje, diretor de Expansão na Corsan, justamente do setor em que devem estar os responsáveis pelos orçamentos conforme a CAGE?
Na página 44 do relatório, lê-se: "O preço pago pelas obras fica sempre extremamente próximo dos preços máximos aceitáveis calculados pela Companhia". Se os deputados tivessem tido oportunidade de acesso ao relatório, verificariam que, no item 2.2, fica bastante evidenciado que venceram as licitações os que apresentaram preços com percentuais de 99,6%, 97,8% e 98,6% em relação ao preço máximo apontado pela Corsan.
Dr. Paulo Michelucci, o Senhor não considera no mínimo estranho que uma empresa vença uma licitação com um percentual tão próximo do preço máximo aceito pela Companhia, quando a lógica da concorrência nos levaria a acreditar que as empresas apresentam preços mais baixos, justamente para terem chances de ganhar uma licitação? Não é uma coincidência muito grande que seis empresas apresentem preços entre 99,9% do preço máximo aceito pela Companhia?
Na mesma página do relatório da CAGE consta que "as empresas interessadas em participar do processo licitatório devem apresentar um atestado de visita ao local da obra, devidamente visado pelo Superintendente de Expansão" - grifado pela CAGE. Esse visto foi instituído pelo governo atual, para cuja obtenção há um prazo de alguns dias antes da entrega dos preços que as empreiteiras deverão apresentar para licitação.
Apenas para exercício de possibilidade, o Senhor não considera possível que, sabendo dois dias antes da entrega de preços quais os concorrentes à licitação, o responsável por esses vistos - o superintendente de Expansão - tenha condições de, numa simples reunião, promover um acordo de preço entre as empreiteiras, o que inclusive explicaria o fato de elas conseguirem vencer uma licitação com quase o preço máximo aceito? A norma instituída pelo governo atual de que o superintendente deve dar o visto para todas as empreiteiras credenciadas não abre essa possibilidade?
O relatório da CAGE mostra-nos ainda que, na concorrência internacional mencionada pelo Senhor, exclusivamente para compra de materiais, os tubos foram orçados em 1 real e 16 centavos e 1 real e 78 centavos a unidade; ao serem cotados em conjunto os materiais e serviços, os preços dos mesmos tubos são bem mais altos: 3 reais e 43 centavos. O Senhor alega que não tinha conhecimento desses preços. Não lhe parece lógico que, quando se faz uma licitação conjunta de material e mão-de-obra, o preço seja mais alto do que quando se faz uma licitação apenas de material?
A Corsan sempre fez licitações separadas; o atual governo instituiu a prática das licitações conjuntas de material e mão-de-obra. O Senhor afirma que não tem onde guardar o material. Não é possível se fazer um acerto com a empresa fornecedora do material no sentido de que esse seja entregue somente quando a licitação da obra já tiver sido feita, para não haver o problema da guarda do material? O que aconteceu para que a Corsan tenha perdido condições de guardar o material? Por que o governo mudou a prática de licitar serviços e obras separadamente, fazendo-o agora num mesmo pacote, mudança essa que proporcionou uma elevação significativa de preços?
Até o governo passado, as licitações promovidas pela Corsan que envolvessem tubos admitiam o uso de vários materiais - como o aço, por exemplo, que é inclusive aprovado pela Cientec, em parecer registrado no relatório da CAGE. Neste governo, algumas concorrentes começaram a contrariar essa prática, que, inclusive, é adotada pela Sabesp, de São Paulo, e pelo DMAE. A Corsan passou a exigir apenas o ferro fundido nessas licitações. Coincidentemente, há apenas uma empresa no Brasil que fornece o ferro fundido - a Barbará.
Coincidência maior ainda é que, depois que a Corsan instituiu essa reserva de mercado para a Barbará, os tubos de ferro fundido tiveram um aumento de mais de 200%, ao passo que, no segundo semestre de 1994, quando não havia a reserva de mercado, os preços do tubo de ferro fundido chegaram a cair 10%. E mais, a Fundação Getúlio Vargas, de acordo com o próprio relatório, indica que o preço da matéria-prima ferro fundido, no mesmo período em que os tubos subiram 200%, teve aumento de apenas 24%. Parece que o governo resolveu estabelecer uma regra para gastar sempre a maior quantidade possível de dinheiro público, inclusive contrariando o princípio da economicidade, que é previsto pela própria Constituição.
As irregularidades apontadas pelo relatório são bastante claras, o que o governo não quer admitir. Poderíamos discutir se o relatório da CAGE está correto ou equivocado; mas devemos partir da premissa de que tal documento apresenta diversas irregularidades e ilegalidades. Caso contrário, não haveria a recomendação do envio do relatório ao Tribunal de Contas para ser anexado às contas dos administradores da Corsan daquela época nem recomendaria a responsabilização dos autores, co-autores ou responsáveis por essas atitudes. Ninguém é responsabilizado por algo que não seja irregular.

Nenhum comentário:

Postar um comentário